Na varanda da velha casa, havia semanas que a cadeira fazia
ruídos, mesmo sem algum vento para embalá-la. No quarto, suplicas ecoavam no
vazio:
__ Mamãe, tô com medo; papai, não fique zangado comigo.
Enquanto a voz aos poucos se esvaía, a morte, que não
possuía face nem forma, fazia-se ouvir, arrastando um chinelo de pano pelo
assoalho barulhento.
__ Não me abandone, mamãe! Paizinho, eu não tive culpa. Foi
um acidente. Quem vem chegando?
Pela janela, olhava o dia sendo lentamente tomado pela
escuridão.
__ Eu sinto falta de seu colo, mamãe, estou com muita dor.
Papai, eu estava brincado. Quem vem chegando? É você, papai? Vem trazer meu
chá?
Enquanto a agonia permanecia no quarto, na sala, a morte,
indiferente, aproxima-se vagarosamente.
__ Papai, foi muito rápido. Praticava tiro ao alvo em uma
velha lata com a velha espingarda. Sei que amava demais aquele cavalo.
Perdoe-me, mamãe! Não me abandone! Tenho medo de morrer no escuro, ascenda a
lamparina.
Nem mesmo as lágrimas tinham mais força para escorrer em sua
face, ficavam presas nos cantos dos olhos.
Sem cerimônia, a morte adentrou no quarto sem bater. A
cadeira de balanço parou. O espírito desvencilhou-se do seu corpo aos 87 anos,
assim como o sol se desvencilha das nuvens carregadas.
Livre do peso do corpo, alegrou-se ao ver pela janela seu
pai cavalgando montado no velho alazão. Apeou, aproximou-se, estendendo-lhe as
mãos, conduziu-o até a sua velha mãe, que, sentada minutos antes estava
inquieta na cadeira de balanço, abriu os braços e falou:
__ Vem cá, filhinho! Antes de partimos sente no colo da
mamãe. Faz meio século que espero este momento.
perdão pelos erros, tive que redigitar.
Do livro : Conto dos contos e outros contos, JDamasio,2001
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